Resgatar os náufragos ou como um musical pode ser terapêutico

20-09-2024


Há quem não goste de musicais.

Há quem não admita que gosta de musicais.

Há quem não goste nem desgoste.

Há quem goste de espectáculos que são feitos com Verdade, independentemente do género. É aqui que me encaixo. Eu, que sou uma desencaixada por natureza.

Em Portugal não há, propriamente, uma tradição de musicais. Há, sim, Teatro de Revista, que embora tenha música não é um musical. Têm-se feito alguns é certo, mas não temos a tradição que há em Londres ou Nova Iorque. Talvez por isso os portugueses que vão a Londres e a Nova Iorque comprem mais facilmente bilhetes para o West End ou para a Broadway do que para os Teatros portugueses. No entanto, que "los hay, los hay". Os musicais, claro.

Está em cena no Teatro Maria Matos um Musical muito representado na Broadway, precisamente. "Querido Evan Hansen" com encenação de Rui Melo, mistura actores experientes como Gabriela Barros, Miguel Raposo e Sílvia Filipe com jovens e ilustres desconhecidos como Brienne Keller, Dany Duarte, Inês Pires Tavares, João Maria Cardoso e João Sá Coelho.

O texto conta-nos a história do adolescente Evan Hansen que está no último ano do liceu e vive em permanente ansiedade porque procura o seu espaço, ser visível, contar para os outros. É um jovem solitário como tantos que vemos, mas não observamos. Escrever uma carta que começa com "Querido Evan Hansen, hoje vai ser um dia bom", é o acordo que tem com o seu psicólogo. "Eu estou aqui" é a mensagem que quer passar. E é a partir desta carta, que vai cair nas mãos erradas, que se desenrola a história.

O espectáculo aborda temáticas como a solidão, a incompreensão, a invisibilidade de certas pessoas, a falta de empatia, a ausência de afecto, a falta de escuta e tantas outras ansiedades que calam fundo nos jovens e não só. Fala dos "náufragos" que pedem para ser resgatados da sua solidão e da indiferença a que são votados, só porque são tímidos, feios, gordos, magros, muito inteligentes, pouco inteligentes, "esquisitos", fora da norma… Quem nunca se sentiu "náufrago" uma vez na vida que atire a primeira pedra.

Há diversos momentos no espectáculo muito emotivos e que só pessoas muito insensíveis não se sentirão tocadas. Ou aqueles que têm uma grande superioridade moral ou intelectual, claro.

Cumpre ainda outra função que é espoletar tema de conversa entre pais e filhos ou entre amigos e, quem sabe, provocar alguma reflexão sobre os comportamentos e a forma como olhamos (ou não) olhamos para o Outro.

No final do espectáculo estava um jovem, talvez com 16/17 anos, na fila à minha frente, que chorava compulsivamente. Era negro e imaginei o que lhe iria na alma e no coração naquele momento, depois de ver a peça. Estava acompanhado por adultos que o abraçaram com afecto. Chorava ele e chorava eu. Pelas emoções que o espectáculo me provocou e por ver aquele menino a chorar daquela forma

Este espectáculo devia ser prescrito pelos psicólogos, não só para jovens, como para adultos, pais ausentes, professores intolerantes e para qualquer ser humano que queira ser melhor!


Teresa Rouxinol | 20 de Setembro de 2024


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